Levando as metas de pressão arterial abaixo (de novo) pela BPROAD

MBE em Foco - Volume 12, Issue 10

Referência: N Engl J Med. 2025 Mar 27;392(12):1155-1167

Conclusão prática: Outro ensaio do controle intensivo da pressão arterial sugere uma pequena redução nos AVCs não fatais com uma meta de pressão arterial sistólica ≤ 120 mmHg nos pacientes diabéticos com risco cardiovascular elevado.

Pérola da MBE: Cuidado com os desfechos compostos inflados que tiverem sua significância impulsionada por um único desfecho, especialmente se ele for um evento não fatal.

George Washington Carver disse uma vez: "no jardim da ciência, até as ervas daninhas podem se tornar flores se receberem cuidados suficientes". Como o décimo primeiro ensaio que busca um benefício do controle intensivo da pressão arterial em comparação às metas padrão, o ensaio BPROAD pode ser enxergado como essa flor. Se for esse o caso, será que isso torna o ensaio ACCORD uma erva daninha? Voltaremos a isso. Por enquanto, aperte os cintos.

Quando se trata de controlar a hipertensão muitos médicos presumem que, como existe uma ligação entre uma pressão arterial relativamente baixa (ou seja, normal) e longevidade, reduzir ainda mais a pressão arterial continuará a beneficiar os pacientes. Muitos trabalham para reduzir a pressão arterial para atingir metas cada vez mais baixas, nunca questionando a abordagem dogmática de "quanto menor, melhor" apesar da ausência de evidências de ensaios randomizados que apoiem essa estratégia. Há uma diferença entre um paciente tão saudável que naturalmente tem uma pressão arterial sistólica (PAS) de 110 mmHg e um paciente que tem uma PAS de 110 porque está medicado. E, mais importantemente, há uma diferença em seus desfechos, incluindo os danos iatrogênicos. Embora evidências de alta qualidade apoiem que algum grau de controle da PA (< 140/90) leva a desfechos melhores nos pacientes com hipertensão, a maioria dos estudos e revisões sistemáticas ainda não demonstrou um benefício clinicamente importante de metas de PAS mais intensivas, como < 120, mesmo em pacientes que achamos que deveriam se beneficiar, como aqueles com diabetes. E talvez essa seja uma das razões pelas quais os pesquisadores continuam repetindo basicamente o mesmo estudo—porque os resultados ainda não provaram o que eles acreditavam ser verdade.

Para contextualizar, vamos destacar alguns dos principais desenvolvimentos no tratamento da hipertensão que antecederam o ensaio BPROAD:

  • JNCs 1-3 (1977-1984): Estudos apenas observacionais focados nas pressões arteriais diastólicas (PADs) que informaram a meta de tratamento para a PAD < 90
  • JNCs 4-6 (1988-1997): Primeiros estudos a incluir a PAS, mas ainda sem ensaios clínicos; primeira meta sistólica, em 1993, de < 140/90
  • JNC 7 (2003): Dados de ensaios limitados, metas de < 140/90, ou < 130/80 se doença renal crônica (DRC)
  • JNC 8 (2014): Primeira a refletir uma revisão sistemática de dados de ensaios apenas (sem dados observacionais); resultou em metas recomendadas de < 140/90 para < 60 anos ou qualquer idade com diabetes ou DRC; e < 150/90 para ≥ 60 anos
  • UKPDS 38 (1998):
    • Grande ensaio não cego em adultos com diabetes recém-diagnosticado comparando metas de pressão arterial intensivas (< 150/85) com padrão (< 180/105) ao longo de ~8 anos, embora as PAs alcançadas tenham sido de 144/82 e 154/87, respectivamente
    • Desfecho primário: Composto de 21 desfechos macrovasculares e microvasculares individuais
    • Resultados: O controle mais intensivo da PA foi associado a uma redução no desfecho composto, impulsionado principalmente pela redução de complicações relacionadas a AVC e diabetes, incluindo morte.
    • Ponto de atenção: As metas de pressão arterial eram muito mais altas que os padrões atuais, dificultando a comparação com dados mais recentes.
  • Ensaio ACCORD BP (2010):
    • Ensaio grande projetado principalmente para avaliar um controle glicêmico rigoroso vs. o padrão em adultos com diabetes, mas com uma avaliação paralela dos efeitos de metas intensivas (< 120) vs. as padrão (< 140) para a PAS
    • Desfecho primário: Composto de morte cardiovascular, infarto do miocárdio (IAM) não fatal e acidente vascular cerebral não fatal
    • Resultados: Nenhuma diferença no desfecho primário; pequena redução em qualquer acidente vascular cerebral ou nos acidentes vasculares cerebrais não fatais
  • Ensaio SPRINT (2015):
    • Ensaio grande que avaliou uma meta de PAS intensiva (< 120) vs. a padrão (< 140) em pacientes ≥ 50 anos sem diabetes com risco cardiovascular aumentado que foi encerrado precocemente devido ao benefício
    • Desfecho primário: Composto de infarto do miocárdio, síndrome coronariana aguda, acidente vascular cerebral, insuficiência cardíaca descompensada aguda e morte cardiovascular
    • Resultados: O grupo intensivo teve o desfecho composto significativamente reduzido, com redução significativa das mortalidades cardiovascular e por todas as causas e redução nas insuficiências cardíacas.
    • Pontos de atenção:
      • A pressão arterial foi medida, em média, 3 vezes com o uso de um dispositivo automatizado autônomo após 5 minutos de repouso em silêncio, o que é diferente de qualquer outro estudo e provavelmente resultou em PAS significativamente mais baixas do que o esperado em um cenário clínico típico ou nos outros estudos. Ou seja, as PAS de 120 e 140 do SPRINT são provavelmente equivalentes a 130 e 150 nos outros estudos. É importante ressaltar que os detalhes deste método estavam escondidos nas informações suplementares.
      • Os resultados são discordantes de muitos estudos anteriores e levam a intervalos de confiança amplos (ou seja, menos confiança nos resultados) quando incluídos em revisões sistemáticas.
  • Revisões Sistemáticas:
    • Revisão Cochrane de 2009:
      • Revisão sistemática e meta-análise de 7 ensaios que compararam diferentes metas diastólicas (não foi encontrado nenhum ensaio de metas sistólicas!)
      • Comparadas < 135/85 vs. < 140-160/90-100; não encontrou redução na morbidade ou na mortalidade com a meta menor
    • Revisão sistemática para atualização das diretrizes da ACC/AHA de 2018:
      • Revisão sistemática de 15 ensaios clínicos randomizados, incluindo o ensaio SPRINT
      • Em geral comparou as metas de PAS < 130 vs. < 140; não encontrou benefício de mortalidade, mas sim reduções nos acidentes vasculares cerebrais, infartos do miocárdio e insuficiências cardíacas com a meta mais baixa
    • Revisão Cochrane de 2020:
      • Atualização da meta-análise Cochrane de 2009 com 7 novos ensaios, incluindo o ensaio SPRINT
      • Comparou metas padrão (< 140) vs. metas "inferiores"; não encontrou redução na mortalidade ou nos eventos adversos graves, mas uma redução moderada nos infartos do miocárdio não fatais e nas insuficiências cardíacas

Portanto, o recém-publicado ensaio BPROAD é o mais recente a avaliar o benefício clínico de um controle intensivo (< 120 mmHg) em comparação com o controle padrão (< 140 mmHg), desta vez em adultos mais idosos (idade média de 63 anos) com diabetes na China. Ao início do estudo, os 13.000 pacientes recrutados tinham uma PA média de 140/76, uma HbA1c de 7,6% e tomavam 1-2 anti-hipertensivos (principalmente BRAs e BCCs). Um quarto tinha história de doença cardiovascular clínica. Todos os pacientes continuaram com o tratamento habitual, mas metade deles recebeu uma meta de PAS de < 120 e a outra metade recebeu uma meta de < 140. Os pacientes permaneceram cegos, mas os médicos estavam cientes da alocação. Os pacientes do grupo da meta intensiva acabaram recebendo cerca de um anti-hipertensivo a mais.

Após cerca de 4 anos de acompanhamento, os pesquisadores encontraram um pequeno benefício do controle intensivo para uma combinação de infarto do miocárdio não fatal, acidente vascular cerebral não fatal, tratamento ou hospitalização devidos a insuficiência cardíaca, ou morte por causa cardiovascular (razão de riscos [HR] de 0,79 [0,69-0,90]), impulsionado quase que inteiramente por uma redução nos acidentes vasculares cerebrais não fatais (HR de 0,79 [0,67-0,92]). Este resultado reflete aqueles demonstrados em revisões sistemáticas anteriores, nas quais o controle mais intensivo não demonstrou efeito sobre a mortalidade, mas quando os componentes de um desfecho composto foram analisados individualmente, foi encontrada uma redução em eventos não fatais.

Permita-nos lembrá-lo do EBM Focus: Nonfatal Myocardial Infarction (MI) — Death of a Surrogate?, que discute exatamente como a inclusão de eventos não fatais pode inflar a percepção do benefício de um tratamento quando agregados às taxas de mortalidade e, portanto, por que não devemos combinar rotineiramente mortalidade e eventos não fatais em análises compostas. Embora pareça fazer sentido que uma redução nos eventos não fatais seja um bom substituto para uma redução nos eventos fatais relacionados, as evidências sugerem que isso não acontece com frequência suficiente para eles serem substitutos confiáveis. Basicamente, não podemos presumir nada. Às vezes o que acontece nos ensaios não tem nada a ver com o que esperávamos que acontecesse. Aqui está um exemplo: o braço do estudo ACCORD que estudou os efeitos do controle mais intensivo da glicose na realidade encontrou um aumento, e não uma diminuição da mortalidade como era de se esperar.

O diabo mora nos detalhes (que muitas vezes estão escondidos no suplemento, como foi o caso da técnica de medição da PA no estudo SPRINT). No caso do estudo BPROAD, as PAs alcançadas ao final do período de acompanhamento de 4 anos não foram mencionadas em nenhum momento. Conseguimos extrapolá-las a partir de uma figura no suplemento: o grupo do controle intensivo teve uma média de PAS de 117, e o grupo padrão de 133. Isso é interessante, porque as PAs alcançadas a um ano, de 121 e 133, respectivamente, foram relatadas no texto principal. De maneira relacionada, a hipotensão sintomática ocorreu com frequência significativamente maior no grupo do tratamento intensivo, embora não tenha sido relatado nenhum aumento nas quedas. Por que razão estamos dando tanta importância à pressão para além das metas e a essa informação não ter sido divulgada? Bem, uma PAS média de 117 no estudo na realidade significa que a) cerca de metade dos participantes tiveram medidas de pressão mais baixas que isso, e b) as pressões arteriais em domicílio provavelmente foram de cerca de 102-112 com base na diferença estabelecida de 5 a 15 pontos entre as PAs medidas em consultório e em domicílio. Uma pessoa idosa com diabetes e provavelmente outras comorbidades andando por aí com uma PAS de 102 que lhe foi dada não é necessariamente algo que mereça parabéns (hello! As fraturas de quadril têm uma taxa de mortalidade em 5 anos de 18% a 26%).

Então, os estudos que não encontraram nenhum benefício significativo pelo controle intensivo da pressão arterial são "ervas daninhas" e os ensaios SPRINT e BPROAD "são flores" porque finalmente "provaram" o que se acreditava ser verdade o tempo todo—que quanto menor, melhor? A evidência não é tão simples. O estudo BPROAD está se segurando no que se resume a uma redução nos AVCs não fatais, o que, novamente, sabemos que coloca os dados do desfecho primário sob questionamento porque foram incluídos em um desfecho composto com morte. Mesmo se aceitarmos a análise estatística e os dados dos desfechos como são, o que estamos falando aqui é de um benefício absoluto pequeno: 0,4 evento do composto por 100 pessoas-anos (quase todos com probabilidade de serem AVCs não fatais), inexoravelmente agrupados com alguns danos adicionais.

Em vez de ervas daninhas e flores, talvez tudo seja um grande jardim, ou um corpo de evidências se você preferir. Quando reduzimos o zoom e olhamos para o quadro geral, nossa legenda pode dizer que as metas de PAS mais próximas de 120 mmHg podem fazer sentido para alguns pacientes, incluindo aqueles com diabetes com risco particularmente aumentado de acidente vascular cerebral. Mas, infelizmente, ainda não se comprovou que menos é melhor.

Para mais informações veja o tópico Hipertensão na DynaMed.

Equipe editorial do MBE em Foco da DynaMed

Este MBE em Foco foi escrito por Katharine DeGeorge, MD, MSc, editora adjunta sênior da DynaMed e professora associada de Medicina de Família na Universidade da Virgínia. Editado por Alan Ehrlich, MD, FAAFP, editor executivo da DynaMed e professor associado de Medicina de Família na faculdade de medicina da Universidade de Massachusetts; Dan Randall, MD, MPH, FACP, editor adjunto sênior da DynaMed; McKenzie Ferguson, PharmD, BCPS, redatora médica sênior da DynaMed; Rich Lamkin, MPH, MPAS, PA-C, redator médico da DynaMed; Matthew Lavoie, BA, revisor médico sênior da DynaMed; Hannah Ekeh, MA, editora associada sênior II da DynaMed; e Jennifer Wallace, BA, editora associada sênior da DynaMed. Traduzido para o português por Cauê Monaco, MD, MSc, docente do curso de medicina do Centro Universitário São Camilo.